Um empregado da empresa Santa Rita Indústria de Auto Peças Ltda., de
Blumenau (SC) que sofreu humilhações e discriminação de caráter racial
dentro do ambiente de trabalho praticadas por seu superior hierárquico e
colegas receberá indenização de R$ 20 mil por danos morais. A
condenação foi mantida pela Quarta Turma do Tribunal Superior do
Trabalho, que negou provimento a agravo da empresa.
Na
reclamação trabalhista, o operador afirmou que havia, no ambiente de
trabalho, "um grande desrespeito" em relação aos negros, e que sempre
foi alvo de piadas e brincadeiras de cunho racista, "com o conhecimento
dos superiores, que nada faziam para suprimir esses atos". Além das
provas apresentadas por ele, o Ministério do Trabalho e Emprego, após
denúncia, também comprovou, em inspeção fiscal na empresa, que nas
portas dos banheiros da unidade de Blumenau havia inscrições
depreciativas, ofensivas e discriminatórias para com os negros.
A
primeira decisão, da 1ª Vara do Trabalho de Blumenau, julgou
improcedente o pedido de indenização por dano moral. O juiz não entendeu
ter havido prática de racismo ou discriminação. "Os apelidos, mormente
em um ambiente de operários, é perfeitamente aceitável e corriqueiro",
afirmou a sentença.
Para
o Tribunal Regional do Trabalho da 12ª Região (SC), porém, o quadro
trazido no processo comprovou, de forma irrefutável, a prática
discriminatória acintosa com o empregado afrodescendente. As provas
mostraram que durante oito anos, o operador de máquinas foi vítima de
piadas, brincadeiras e apelidos até a sua demissão, por justa causa, em
retaliação ao ajuizamento da reclamação trabalhista.
Ao
reformar a sentença, o TRT-SC ressaltou que nem mesmo a discriminação
de caráter velado ou generalizado pode ser tolerada ou incentivada. "A
leveza ou até o hábito pode afetar o balizamento da condenação, mas não
excluir a ilicitude da conduta", afirma o acórdão. Para o Regional, a
decisão de primeiro grau "está na contramão da história" ao considerar
normal e tolerável "o que não pode ser admitido em nenhuma hipótese".
Esposa "negra"
Segundo
o TRT, "o preconceito divide os seres humanos em patamares
inexistentes", e cabe ao empregador, "no uso de seus poderes diretivo,
hierárquico e disciplinador, impedir que a dignidade humana dos
trabalhadores seja arranhada".
Um
aspecto destacado pelo Regional como "demonstração cabal" da
discriminação racial foi a tese utilizada pela empresa de que a esposa
do preposto era negra. "A afirmação não apenas é contrariada pela
fotografia juntada aos autos como pela própria certidão de casamento,
que mostra que seu sogro e sua sogra (os pais de sua mulher) possuem
ascendentes italianos", afirma o acórdão. "É fato conhecido no sul do
Brasil, inclusive em Santa Catarina, que, em tempos passados, os
racistas mais radicais consideram ‘negros' todos os que não são
‘arianos', inclusive os italianos, colocando como virtude o fato do
trabalhador ser ‘filho de colono alemão'".
Por
decisão do TRT-SC, o empregado receberá, em reparação pelos danos
morais sofridos, indenização de R$ 20 mil. A empresa de autopeças foi
ainda condenada em R$5 mil reais por ter demitido o empregado em punição
pelo ajuizamento da ação trabalhista. Segundo o Regional, "a empresa
não usou de um direito, mas abusou dele e o fez da forma mais mesquinha e
reprovável", passando a seus empregados uma mensagem inequívoca: "vou
ofendê-lo e destratá-lo o quanto me aprouver e, se você reclamar, vai
ainda perder o emprego".
A
Quarta Turma do TST, seguindo o voto do relator, ministro Fernando Eizo
Ono, negou provimento ao agravo de instrumento interposto pela empresa,
ante a conclusão de inexistência de violação de dispositivo de lei ou
ocorrência válida de divergência jurisprudencial capaz de autorizar a
apreciação do recurso de revista.
(Cristina Gimenes/Carmem Feijó)
FONTE: Tribunal Superior do Trabalho